Como seria a vida de um adolescente na busca de sonhos estapafúrdios?
Como seria a vida guiada por um desejo incalculável de abraçar o mundo, fazer tudo? Sendo que apenas tentar escrever, ou rabiscar, ou tropeçar nas sapatilhas brancas ou somente tentar ressuscitar as verdadeiras faces das personagens perdidas, não fosse suficiente.
Nisto se baseia este diário eletrônico, onde disperso ilações psicológicas, filosóficas e poéticas da minha vida em São Paulo.

sábado, 4 de junho de 2011

07 de junho de 2010 Entulho Humano


São Paulo é uma cidade dolorosa, é inquieta e contrastante. É fácil lembrar do barulho, do cheiro, comentar dos gostos, dos lugares. Não sei se todos se lembraram das dores. São Paulo reverbera sofrimento, mesmo com o trânsito, a bagunça, o progresso, escuta-se gemidos, murmúrios de homens aos cantos, viadutos, famílias inteiras chamando. Difícil encontrar justificativa, talvez seja conseqüência de um progresso canalizado, onde a água límpida desse cano deságua pela torneira em um belo jardim e os dejetos descem pelo ralo e despejam-se nos cantos da casa. É todo o tipo de gente, todo o tipo de sorte. Uma exposição de arte ao ar livre, uma instalação intitulada Descaso, Dor ou Indulgência.
Acho que sou imaturo para escrever, posso observar, todavia falta conhecimento para argumentar sobre o assunto, seria flertar sobre política, sobre competência ou outros fatores que contribuem para essa infestação de famílias nas ruas da cidade.
Aqui os pedintes entram em estabelecimentos comerciais, vendem frases, pedidos e bênçãos divinas, são surdos, mudos, crianças ou senhores com expressões dóceis e carinhosas. Não se trata, normalmente, de opções, difícil recusar ao pedido carente de pessoas que, ao meu ver, são tão necessitadas.
Dia desses um senhor entrou desesperado na loja onde trabalho, pedindo para fazer uma ligação para um hospital de Minas. Tratava-se de um senhor de muita idade, trabalhador de roça em Minas, estava em São Paulo, pois fora encarregado de trazer para analise uma amostra do tumor de sua esposa, no ônibus esse senhor humilde, fora assaltado, levaram tudo, seu dinheiro e até mesmo a amostra para analise que carregava. Minha chefa Bia, vendo o desespero e a sinceridade daquele senhor, permitiu a ligação, do outro lado da linha a funcionária do hospital, dizia que não poderia entrar em contato com o dono da roça, a quem o senhor confiava o envio do dinheiro para comprar as passagens de volta. A tristeza era visível nos olhos daquele senhor, ele conversava conosco, devia passar por sua cabeça como seria sua noite em São Paulo, nos explicou que a prefeitura não se posicionou para ajudá-lo tentou todos os órgãos competentes, mas não obteve resultados. 


No fim da história a Bia pagou as passagens do senhor para que ele voltasse para junto de sua esposa, ele ofereceu seus serviços em troca do pagamento, mas não havia tempo. Saiu chorando e agradecido parecia envergonhado, com o ego abalado e todos nós comovidos.
A  realidade insiste em manter-se imutável, parece  difícil reestruturar uma cidade, permiti-la receber melhor seus visitantes. Ainda existiram seres humanos cambaleando pela  cidade grande, no entanto o que a enfeiúra  não são os pés sujos desses homens, suas roupas apodrecidas e cabelos desgrenhados, mas sim seus olhos tristes e sofridos, sua fome, sua sede, a falta de perspectiva de vida e o caminho escuro que foi oferecido.
Beijos e abraços

PS: Muita sorte ao Senhor de Minas, espero que esteja bem e ao lado de sua esposa.

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